A ARCA - A arte em ser do contra!
 
Menu du jour! Tutu Figurinhas: o nerd mais bonito e inteligente dessas paragens destila seu veneno! GIBI: Histórias em Quadrinhos, Graphics Novels... é, aquelas revistinhas da Mônica, isso mesmo! PIPOCA: Cinema na veia! De Hollywood a Festival de Berlim, com uma parada em Nova Jérsei! RPG: os jogos de interpretação que, na boa, não matam ninguém! ACETATO: Desenhos animados, computação gráfica... É Disney, Miyazaki e muito mais! SOFÁ: É da telinha que eu estou falando! Séries de TV, documentários... e Roberto Marinho não está morto, viu? CARTUCHO: Videogames e jogos de computador e fliperamas e mini-games e... TRECOS: Brinquedos colecionáveis e toda tranqueira relacionada! Tem até chiclete aqui! RADIOLA: música para estapear os tímpanos! Mais informações sobre aqueles que fazem A Arca Dê aquela força para nós d´A Arca ajudando a divulgar o site!
Artigo adicionado em 29/08/2006, às 05:31

O ESTRANHO MUNDO DOS CONTOS DE FADAS
Na época em que o Lobo comia a Chapeuzinho e as irmãs da Cinderella decepavam os próprios pés… M. Night Shyamalan foi buscar o enredo de seu mais novo filme a aportar no Brasil, A Dama na Água, nas historinhas que contava para seus filhos antes de estes dormirem, sobre o que acontecia na piscina […]

Por
Francine "Sra. Ni" Guilen


M. Night Shyamalan foi buscar o enredo de seu mais novo filme a aportar no Brasil, A Dama na Água, nas historinhas que contava para seus filhos antes de estes dormirem, sobre o que acontecia na piscina de sua casa enquanto eles dormiam. Porque os criativos que se prezam não se contentam em repetir à exaustão os clássicos contos de fadas – eles criam novos contos de fada. E os criativos endinheirados ainda transformam esses novos contos de fada em um filme, lançado junto a um livro infantil narrando a mesma história, com ilustrações, chamado Lady in the Water: A Bedtime Story. Segundo o próprio diretor proclama, A Dama na Água é isso mesmo, um conto de fadas, desses para se contar às crianças na cama, ou uma homenagem a eles. Um pisão no pé daqueles seres céticos que só gostam de usar uma parte do cérebro: a mais chata.

Se os contos de fada hoje em dia estão fadados ao esquecimento, a gente deve agradecer principalmente ao caro senhor Walt Disney que nos fez o favor de eternizar ao menos por umas décadas a mais esses contos, transformando-os em desenhos mágicos feitos na era de ouro dos famosos estúdios de animação Disney. Mas eles são muito, mas muito mais antigos do que isso, e têm muito mais história do que se imagina. Só para você ter uma idéia, a versão mais antiga da história da Cinderella é datada de algum ano por volta de 860 a.C, e vem da China.

Mas antes de mais nada, o quê, afinal, pode ser caracterizado como um conto de fadas? Eles são uma variação do que é conhecido como conto popular ou fábula, e têm como principais características o fato de serem uma história curta, sem reviravoltas complexas, repassada oralmente, com um protagonista herói (ou uma heroína) que precisa passar por várias etapas e vencer o mal. Geralmente envolvem alguma magia que transforma um dos personagens, e ironicamente, a maioria desses contos não possui fadas.

Eles são da mesma família, mas não são a mesma coisa que:

– Contos de encantamento: histórias em que alguém ou algo passa por alguma transformação através de uma magia
– Contos maravilhosos: histórias em que coisas mágicas e sobrenaturais aparecem como parte integrante do universo. Geralmente são aqueles contos orientais, como os vistos na coletânea As Mil Uma Noites, e mostram alguém pobre que consegue vencer na vida depois de enfrentar problemas e conquistar poder, fama e riqueza
– Fábulas: histórias protagonizadas por animais falantes, quase sempre com uma estrofe explicando a moral ao final do conto
– Lendas: histórias que contam a origem de algo, em que geralmente a magia provém de algum ser divino
– Contos de enigma ou mistério: histórias que têm alguma coisa a ser desvendada
– Contos jocosos: histórias metidas a engraçadinhas

Todos esses tipos de narrativas têm algo em comum: têm só um núcleo dramático, sem muitos personagens secundários que não tenham a ver com a trama principal, e são histórias simples, quase sempre previsíveis. Existe toda uma explicação psicológica-antropológica-sociológica para isso, mas não faz muito sentido falar sobre ela aqui, até porque é um tanto óbvio: contos populares e feitos para crianças, narrados boca a boca, não podem ser muito complicados de se contar e de entender. E o sentimento de já saber mais ou menos como a história vai se desenrolar transmite uma certa segurança, que as pessoas (menos os cults nojentos, como o Zarko), no fundo, gostam e se sentem bem.

A origem do que conhecemos hoje como contos de fada é celta. As primeiras narrativas que mencionam as adoráveis fadas são da Idade Média, a época das novelas de cavalaria, que bebiam bastante da fonte céltica. É dessa época, inclusive, o surgimento da lenda do Rei Artur, e todos os elementos místicos que rondam essa história – nela, Artur é levado para a ilha de Avalon por um bando de fadas. Foi lá para o século XII que as histórias começaram a ser espalhadas pela Europa, em um trabalho de fusão entre a cultura céltico-bretã e o cristianismo, que acabou tirando um pouco os elementos mágicos da coisa toda.

Para começar, nos seus primórdios eles nem mesmo eram feitos para crianças. Pois sim, as primeiras versões de alguns dos contos mais famosos que chegaram aos nossos dias são beeeeeeem espinhudas. Senão, vejamos: o final original de Chapeuzinho Vermelho não tinha nenhum caçador chegando e salvando a pátria, arrancando a presa de dentro do Lobo. A versão que corria boca a boca nos séculos passados contava que, assim que Chapeuzinho chega na casa da avó, se depara com o Lobo Mau, que pede para que a menina tire sua roupa – assim mesmo, peça por peça – e se deite com ele. Depois ele devora a garotinha. Agora a utilização do verbo “devorar” aqui você é quem escolhe o_O. E se isso é forte demais para você, é melhor nem saber que o sapatinho de Cinderela, na realidade, ficou preso na escada porque o esperto príncipe jogou piche nos degraus, e as duas irmãs malvadas, na ânsia de pegar o rapazote, cortaram fora, respectivamente, o dedão do pé e o calcanhar para que seus pés coubessem no sapato de cristal. E só foram desmascaradas porque o sangue tomou conta do calçado. Como castigo, as moçoilas têm seus olhos arrancados pelos mesmos pombos que ajudam Cinderella com o vestido, no dia de seu casamento. A Bela Adormecida também não escapa às mazelas da vida: suas primeiras versões contavam que, enquanto ela dormia, o tal príncipe foi um pouco além do beijo e deixou a princesa grávida. Outro exemplo é o conto da Princesa que não sabia Sorrir, no qual a protagonista foi condenada a viver uma vida solitária só porque viu, sem querer, “partes inadequadas” do corpo de uma bruxa. E, por fim, no conto Pele de Asno, temos um pai que quer se casar com a própria filha. Tudo muito trivial e meigo.

Esses contos com um teor um tanto quanto sanguinolento e nada disneyano não têm, no entanto, um autor definido. A maioria dos contos de fada foi coletada por certos indivíduos estudiosos da língua, através de pesquisas de relatos populares. Mas sua origem é desconhecida, ou seja, eram histórias populares contadas de pai para filho, ou em reuniões de amigos. É, eles não tinham televisão, Orkut e outras tranqueiras: transmitir essas histórias uns para os outros era uma diversão (e devia mesmo ser divertido =D), que eles faziam quando se encontravam nos campos, enquanto as mulheres fiavam, e demais ajuntamentos de gente adulta.

Os responsáveis por amenizar essas histórias foram alguns indivíduos bem-intencionados durante a História, mais especificamente a partir do século XVI, que as coletaram e catalogaram, trocando as partes mais pesadas por algo mais adequado às crianças, por uma boa causa: queriam levar esses contos populares que estavam sendo esquecidos desde aquela época, à criançada, já que tinham tudo para fazer sucesso entre ela – como elementos mágicos – e podiam ser usadas pedagogicamente, com uma moral para ensinar às crianças uma coisa ou outra. Também, era a época do Romantismo, que deixou as coisas um pouco mais cristãs e menos violentas, dando mais valor ao “paz e amor” que a pés decepados. Com o passar de tantos anos, é natural que tantas traduções, retraduções e adaptações tenham alterado consideravelmente a história original, mas não pense você que a censura à época tenha sido tão pesada assim: muita coisa foi cortada, mas mesmo nas versões elaboradas pelos Irmãos Grimm alguns momentos proibidos para os fracos de coração continuaram existindo. É bom avisar os pedagogos xaropes de hoje que sangue e monstrengos não são uma invenção dos roteiristas de animes de hoje. Qualquer um que tenha lido As Histórias da Tia Nastácia, do Monteiro Lobato, lembra dos desfechos trágicos de algumas das fábulas, que terminavam com pessoas malvadas sendo arrastadas e pisoteadas por cavalos. E, convenhamos, uma bruxa canibal que quer engordar crianças para posteriormente comê-las não é algo assim tão politicamente correto.

Reza a lenda que a popularização dessa passagem de “coisa de adultos” para “histórias infantis da carochinha”, ocorreu na Inglaterra apenas no século XIX, com o trabalho de vendedores ambulantes que começaram a vender as historietas em pequeninos livros baratos sem as passagens mais picantes. Enquanto na França, já teriam chegado bem antes, através do francês Charles Perrault, no século XVII.

:: CHARLES PERRAULT

Nasceu em Paris, no dia 12 de janeiro de 1628, e morreu na mesma cidade, em 16 de maio de 1703. Era escritor, contemporâneo do gaulês famoso coletor de fábulas La Fontaine. Era advogado, e começou o trabalho de registro de histórias já mais velho, escrevendo os contos que sua mãe contava para ele quando criança. O primeiro livro foi publicado em 1697 e se chamava Histórias ou contos do tempo passado com moralidades, embora o nome que realmente fez sucesso tenha sido Contos da Mamãe Gansa, fazendo referência a uma figura do folclore francês, que está sempre cercada por filhotes que gostam de ouvir suas histórias. Seus textos já tinham um teor mais destinado ao público infantil, mas a sua primeira intenção era defender a literatura francesa e a causa feminista (!), e ainda possuíam muita violência, que foi amenizada por seus predecessores no trabalho de contador de histórias.

Principais contos de fadas: A Bela Adormecida, Chapeuzinho Vermelho, Cinderela, O Gato de Botas, O Pequeno Polegar, A Paciência de Grisélidis, Os Desejos Ridículos, A Pele de Asno, O Barba Azul, As Fadas, Henrique do Topete.

:: IRMÃOS GRIMM

Os dois irmãos alemães que ganharam recentemente uma supimposa versão cinematográfica toda romanceada pelo felizmente insano Terry Gilliam, atendem pelo nome de Jacob e Wilhelm Grimm. Suas contribuições para a literatura alemã foram muitas, e vão além dos contos de fadas: criaram um Grande Dicionário Alemão e dedicaram suas vidas a estudar a lingüística e o folclore do seu país. Ambos fizeram Direito, e passaram muitos anos trabalhando em bibliotecas. Seu interesse por contos de fadas veio de um estudo que pesquisava a evolução da linguagem, com a intenção de determinar as identidades nacionais de cada país – e isso foi feito por meio da coleta das narrativas de contos populares nos mais diversos cantos da Alemanha (além de outros países da Europa, especialmente da França, já que também utilizaram alguns contos transcritos por Perrault). Os dois irmãos trabalharam juntos durante toda a vida, e com a idade de 30 anos já tinhham uma certa fama na área O resultado das pesquisas surgiu entre 1812 e 1822, com a publicação de uma coletânea de 100 contos: Contos de Fadas para crianças e adultos.

Principais contos de fadas: Pele de Urso, A Bela e a Fera, Cinderela, João e Maria, A Bela Adormecida, Branca de Neve, Chapeuzinho Vermelho, O Gato de Botas, O Pequeno Polegar, Rapunzel, Os Músicos de Bremen.

:: HANS CHRISTIAN ANDERSEN

Assim como os dois antecessores, Andersen também já ganhou vida nos cinemas, e mais de uma vez: dentre elas em um musical bem doce-de-leite mas bonitinho da década de 50. Esse escritor, nascido na Dinamarca, foi um pouco mais além que os caras acima citados: além de organizar contos já conhecidos, criou outros que conseguiram ficar tão consagrados quanto os populares e mais antigos. São de sua autoria quase duzentos contos de fadas (entre os criados por ele e os transcritos da cultura popular), que foram publicados na coleção Contos, lançada entre 1835 e 1872, sempre na época de Natal. Com uma infância pobre e filho de um humilde sapateiro, o escritor se consagrou não só na área da literatura infantil, mas também foi ator e bailarino, escrevendo peças teatrais e demais contos e livros, como O Improvisador e Nada como um Menestrel, além de uma autobiografia em dois volumes. Porém, seu maior prestígio veio mesmo com os contos infantis, repletos de humor e ironia à sociedade da época. Ele é considerado o primeiro autor a escrever verdadeiramente para as crianças, e em todos os seus contos vinha embutida uma mensagem de luta entre os fortes e os fracos.

Principais contos de fadas: A Roupa Nova do Imperador, O Patinho Feio, Os Sapatinhos Vermelhos, A Pequena Sereia, A Pequena Vendedora de Fósforos, A Princesa e a Ervilha, O Abeto, A Caixinha de Surpresas, O Pequeno Cláudio e o Grande Cláudio, O Soldadinho de Chumbo.

:: ETC

Tem também as histórias que chegaram até nós como contos de fada, mas que não se encaixam necessariamente nesse rótulo, dos quais se destaca o perfeito Alice no País das Maravilhas, escrito por Lewis Carroll (1865), que não fala de magia, mas é um conto de fantasia totalmente nonsense. A grande brincadeira dos autores da época, cujo outro exemplo foi Carlo Collodi, o autor de Pinóquio, era misturar o surreal com o racionalismo, que entrou na moda na época. Outros exemplos supimpas de histórias para crianças que se transformaram em clássicos e ganharam versões mil para os cinemas são Peter Pan (1904), de James Barrie, que foi escrito originalmente em forma de peça teatral; O Mágico de Oz (1900), Frank Baum, que é só o primeiro de uma série que forma cerca de 40 livros, e cuja intenção era reciclar os contos infantis de forma mais divertida e menos moralista, e “As Mil e uma Noites”, o mais antigo de todos, que é uma coletânea de contos maravilhosos de autoria desconhecida, dentre eles, Aladdin e Alibabá e os 40 Ladrões.

Uma belezinha, não? Dá vontade de ler os originais de todos eles e sair por aí cantarolando e louvando o Barão de Munchausen, personagem do excêntrico As Aventuras do Barão de Munchausen, também do Terry Gilliam, dizendo as suas célebres e sensacionais palavras: “Tudo agora é lógica e razão. Ciência, progresso, leis da hidráulica, leis de dinâmicas sociais, leis disso, leis daquilo, e daquilo outro. Não há lugar para cíclopes de três pernas nos Mares do Sul. Não há lugar para árvores de pepinos e oceanos de vinho. Não há lugar para mim”.


Quem Somos | Ajude a Divulgar A ARCA!
A ARCA © 2001 - 2007 | 2014 - 2024